
Guilherme Costa
O governo federal publicou no dia 21 de novembro de 2025 um decreto que institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva e a Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva. Segundo o Executivo, o documento busca fortalecer a inclusão escolar de estudantes com deficiência, transtorno do espectro autista (TEA) e com altas habilidades ou superdotação para todos os níveis, em turmas regulares e escolas comuns. No entanto, o decreto tem gerado intenso debate, ao determinar a universalização das matrículas de estudantes com deficiência em classes comuns, o que, na prática, pode impactar diretamente as APAES. A presidente da Federação das APAES do Estado de São Paulo (FEAPAES/SP), a advogada Dr.ᵃ Cristiany de Castro, participou da edição do programa Café com Entrevista desta sexta-feira (7) para esclarecer o posicionamento da Federação e o impacto da medida.
A Dr.ᵃ Cristiany, que também é membro do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência de Franca, expressou forte preocupação com a redação do decreto: “Nós fomos surpreendidos com a redação que exclui as escolas especializadas”. Ela explica que a parte de educação das APAES “pode não existir mais” com a vigência do decreto, já que determina a universalização das matrículas e que “todos os alunos sejam colocados nas classes comuns”. A presidente questiona a obrigatoriedade da universalização, especialmente para pessoas com “deficiência com maior nível de suporte autista, com nível 3. Pessoa com deficiência intelectual múltipla”.
Seu entendimento é que a medida pode gerar o oposto da inclusão: “o que isso produz, na verdade, não é inclusão”. Ela detalha que, em classes superlotadas e com professores sem especialização, alunos com deficiência mais severa tendem a “voltar para casa, sem acesso educacional algum”. “Sendo isso um retrocesso social. Nós não estamos avançando nesse sentido”.
A presidente da FEAPAES/SP apontou a falta de estrutura das escolas regulares. Ela critica que o decreto prevê uma especialização de somente 80 horas para profissionais de nível médio, o que não garante o preparo necessário. Caso o decreto avance, a perda de recursos e parcerias da educação levaria ao fechamento das escolas das APAES, mesmo que a instituição na totalidade não seja fechada diretamente. Somente no estado de São Paulo, são cerca de 273 APAES na área da educação, beneficiando quase 30 mil alunos, e mais de 100 mil em todo o Brasil. A presidente enfatiza o prejuízo: é “sobretudo, na vida dessas pessoas, porque são pessoas chamadas pelo nome, têm atendimento técnico de qualidade, que têm plano de atendimento individualizado, com equipe de apoio necessária, que iriam para uma rede regular sem estrutura”.
A FEAPAES encampou uma grande campanha, a #RevogaCamilo, solicitando que o Ministro da Educação, Camilo Santana, reveja o decreto, ressaltando que a medida não foi discutida “com as pessoas com deficiência, com as famílias das pessoas com deficiência e com as organizações que atendem pessoas com deficiência”. A presidente reiterou que a verdadeira inclusão não é a imposição de um modelo único. “O que defendemos é um atendimento de qualidade para as pessoas com deficiência intelectual múltipla e autistas”. Para ela, “Inclusão é respeitar as necessidades de cada um”. A Federação defende que o Brasil, em um cenário de grandes desigualdades, precisa de “mais possibilidades possíveis para que essas pessoas tenham atendimento qualificado,” mantendo ambos os modelos de ensino. O debate sobre o decreto continua, com a sociedade e as organizações do Terceiro Setor mobilizadas para evitar o que consideram um grave retrocesso nos direitos das pessoas com deficiência.
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